SACERDOTISA CORNELEND

Capítulo 1 - ARTEFACTOS PALEOLÍTICOS

Capítulo 1

ARTEFACTOS PALEOLÍTICOS


Como sabemos, o homem moderno (ou seja, o Homo sapiens) é originário de África à cerca de 200000 anos atrás. De lá, ele espalhou-se pela Europa e Ásia, vivendo da caça e da colecta, da mesma forma que várias espécies de hominídeos anteriores faziam. Por volta de 50000 a. C., ele começou a fabricar instrumentos de natureza claramente mais sofisticada, tais como ferramentas para perfuração, corte, pontas de lança, etc. Isto marca o início do chamado Paleolítico Superior.

Os arqueólogos acreditam que esses avanços resultaram da invenção da linguagem, o que permitiu ao Homo sapiens trocar ideias e transmitir conhecimentos adquiridos. Além das ferramentas práticas que eles produziam, também deixaram para trás incríveis obras de arte, sob a forma de pinturas rupestres e as chamadas estatuetas de Vénus.

A próxima descoberta foi feita em 1892 por Edouard Piette. Numa caverna no sul da França, ele encontrou uma série de fragmentos de uma estatueta feminina esculpida em marfim de mamute. Um destes fragmentos era uma cabeça muito detalhada, e que foi chamada a Vénus de Brassempouy, derivado do nome de uma vila nas proximidades. Essa escultura foi datada 23000 a. C. 

 

Imagem 1 - Vénus de Brassempouy.

 

Imagem 2 - "A figura com cinto", uma das várias figuras de Vénus descobertas ao lado da Vénus of Brassempouy.


Ao mesmo tempo que a Vénus de Brassempouy foi descoberta, outra escavação estava em curso no norte da Itália, perto da fronteira francesa, em Balzi Rossi. A área tem um grande número de cavernas naturais, e enquanto as explorava, Louis Jullien descobriu um total de 15 figuras femininas. De especial interesse, eram os materiais utilizados para as estatuetas, que consistia em esteatito verde (pedra-sabão) e marfim de mamute.

Não existiram mamutes nessa área, e o esteatito verde é muito raro, isto indica que os materiais deviam ser relativamente valioso, e que a população local teve que viajar ou negociado para obtê-los. Além disso, muitas das estatuetas eram pequenas, e tinha buraco no topo deles, isso indica que haviam sido usados como pingentes. Eles foram datados entre 20 a 25000 a. C.

A próxima estatueta, conhecida como a Vénus de Willendorf, foi encontrada na Áustria em 1908. Ela foi esculpida em pedra calcária e decorada com uma pintura natural vermelho-ocre. Curiosamente, o calcário utilizado não era corrente na área em que a estatueta foi encontrada. Foi datada cerca 23000 a. C.

 

Imagem 3 - Venus of Willendorf.


Outra descoberta ocorreu em 1925, quando a Vénus de Dolni Vestonice foi encontrada na República Checa. Esta estatueta é bastante significativa porque é o mais antigo objecto de cerâmica conhecido no mundo, sendo composta por um material de barro cozido, e datada cerca 27000 a. C. 

 

Imagem 4 - Vénus de Dolni Vestonice.


Assim que a arqueologia começou a captar a imaginação do público, começou também a receber mais financiamento e apoio. Isto resultou numa verdadeira explosão no número de estatuetas de Vénus a serem descobertas. Desde 1925 até agora, foram encontradas mais de 100. Como as escavações tornaram-se mais complexas, cavando-se mais fundo e mais cuidadosamente, as estatuetas mais velhas começaram a aparecer.

A estatueta mais interessante que foi descoberta até agora, é talvez aquela que veio da caverna Hohle Fels, localizada no sul da Alemanha. Também ali, em 2008, uma estatueta feminina conhecida como a Vénus de Hohle Fels foi encontrada, esculpida em marfim de mamute e datada incrivelmente a 35000 a. C. Além disso, e apenas a dois pés da estatueta, também foi encontrada uma flauta esculpida em osso de abutre, também datada, cerca de 35000 a. C. 

 

Imagem 5 - Vénus of Hohle Fels.


Os arqueólogos têm debatido o significado dessas figuras de Vénus por décadas. Em geral, eles costumam discutir apenas um exemplo particular de cada vez, e concentrar-se na análise do local em que foi encontrado, em busca de alguma evidência adicional que possa lançar luz sobre o seu significado. Infelizmente, a maioria dos objectos do Paleolítico eram biodegradáveis e, portanto, não teriam sobrevivido. Objectos em madeira e outros materiais, tais como, plantas, peles de animais, tecidos crus e corda, e até mesmo, muitas ferramentas em osso, que se decomporam há muito tempo... e assim, qualquer informação que poderia ter sido adquirida a partir deles, não está mais disponível.

Na ausência de qualquer evidência conclusiva, têm sido formuladas algumas teorias bastante divertidas. Uma delas, é que as estatuetas podem ter sido uma forma primitiva de pornografia. Outra especulação, é que elas podem ter sido brinquedos para crianças. Ainda outra possibilidade, estas seriam parte de uma espécie de ritual à fertilidade. Vamos considerar brevemente essas teorias.

Nos últimos anos, os arqueólogos começaram a suspeitar que a maioria das estatuetas de Vénus, assim como as pinturas rupestres, pode ter sido realizadas por mulheres. Estas eram do tamanho de cópias de mão, que muitas vezes acompanhavam pinturas rupestres, correspondem a restos femininos do período de tempo encontrados na área. Além disso, os detalhes da roupa que algumas das estatuetas de Vénus traziam vestido, indicam que a pessoa que realizou a escultura, estava muito familiarizada com o vestuário feminino. Desde da existência típica da divisão de tarefas, enquanto os homens caçavam, as mulheres confeccionavam roupas, então, é mais provável que as mulheres tivessem esse conhecimento em particular... e, se de facto, foram elas que produziram a maioria das estatuetas, opõe-se claramente a ideia que elas tenham sido criadas como uma forma de pornografia.

A teoria de que estas tenham sido criadas como brinquedos para as crianças é igualmente problemática. Foram encontrados algumas figuras pequenas de animais, que podiam realmente ter sido brinquedos para crianças... mas as estatuetas de Vénus eram frequentemente esculpidas em rocha sólida, e teria sido muito pesadas para serem usadas como o brinquedo. Além disso, se fossem brinquedos, porque não havia também outro tipo de figuras em geral, no mesmo tamanho e composição? Será que devemos considerar que o brinquedo de quase todas as crianças na Europa, há mais de 20000 anos, foi uma estatueta feminina?

A especulação de que as estatuetas podem ter tido algum tipo de encanto ligado à fertilidade é mais credível, mas deixa-nos ainda sem resposta às nossas perguntas. Embora algumas das estatuetas sejam corpulentas, com os quadrís e seios exagerados, elas não parecem representar a gravidez... de facto, muitas são bastante delgadas. Mas, se as pessoas que criaram estas estatuetas acreditavam no uso das artes mágicas para incentivar a gravidez, porque é que não criaram encantamentos semelhantes para outros fins?

Embora os arqueólogos têm sido relutantes ao comparar artefactos de diferentes culturas e períodos de tempo, agora podem ter um corpo suficiente de provas para tirar algumas conclusões gerais válidas. A grande quantidade de estatuetas implica certamente que deve ter havido algum propósito básico universal para elas. O esforço que levou a criá-las, bem como os materiais raros com que foram produzidas, indica que essas figuras tinham algum valor e significado especial.

Uma vez que muitas das figuras eram usadas como pingentes, foram obviamente concebidas como uma forma de expressão pessoal... ainda como uma mera decoração do corpo, a figura de uma mulher não é particularmente estética. Várias formas geométricas mais simples poderiam ter produzido melhor o mesmo efeito e com muito menos esforço. Podemos também notar que algumas das estatuetas retratam um estilo mais sofisticado de roupas típicas que as mulheres da época usavam normalmente, o que implica que elas podem ter sido representações de um arquétipo da elite, como uma Sacerdotisa ou divindade.

Embora o significado desta evidência seja precoce e incerta, ela sugere a possibilidade de uma crença religiosa que envolvia o tipo de culto de uma deusa primordial.


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