SACERDOTISA CORNELEND

Capítulo 9 - A DEUSA NO EGIPTO

Capítulo 9

A DEUSA NO EGIPTO


O povo do antigo Egipto era indígena nessa região desde o advento da humanidade. Por volta de 10 mil a. C., as mudanças climáticas forçaram estas sociedades tribais a congregarem-se nas margens do rio Nilo. Por volta de 5500 a. C., a transição habitual para uma sociedade agrária e urbanizada já estava em curso.

Como muitas outras civilizações antigas, a primeira forma de religião Egípcia girou em torno das várias forças da natureza... e, de facto, esse foi um tema que se repetiu ao longo de toda a sua história. Coisas como o rio Nilo, a Terra, o céu, e até o próprio ar, eram considerados divindades. Mais tarde, não surpreendentemente, a sua primeira divindade verdadeiramente sensível parece ter sido uma Deusa-Mãe. 

 

Imagem 62 - O Deus do ar Shu, auxiliado por outros deuses, seguram Nut, Deusa do céu, enquanto Geb, Deus da terra, encontra-se em abaixo.

 

No sul do Egipto, a Deusa era originalmente conhecida como Nekhbet, e era frequentemente representada como um abutre branco. Isso, é claro, lembra-nos das pinturas encontradas em Catal Hoyuk e da associação muito precoce do abutre ao processo de reciclagem do corpo do morto de volta à natureza. Curiosamente, na linguagem hieroglífica egípcia, o símbolo do abutre representa tanto "mãe" quanto "governante".

Nas áreas norte da pré-dinastia do Egipto, perto do delta do rio Nilo, a Deusa era originalmente chamada de Wadjet. Ela era geralmente representada como uma cobra.

Além disso, ambos os arquétipos da Deusa Mãe primordial, eram acompanhados por uma deusa guerreira com cabeça de leão. O leão de Wadjet era conhecido como Bast e o leão de Nehkbet chamava-se Sekhmet.

Outra semelhança com as religiões posteriores da Deusa, é que Wadjet e Nehkbet tinham Oráculos, embora não operassem da mesma maneira. Em vez de receber uma comunicação directa da Deusa, os Sacerdotes ou Sacerdotisas simplesmente davam uma resposta baseada na sua opinião. O Oráculo da Wadjet este localizado em Per-Wadjet (agora Buto), e o Oráculo da Nehkbet em Nekheb (agora El Kab).

Por volta de 3200 a. C., o norte do Egipto foi conquistado pelo sul do Egipto, e o país tornou-se unificado. Na mesma época, foi inventado o sistema hieroglífico de escrita e, como resultado, o nosso conhecimento sobre os eventos que se seguiram são mais detalhado. É claro que a história ainda é incrivelmente complexa, devido ao período de mais de 3000 anos que abrange e o vasto tamanho do império egípcio.

Quando o Egipto foi unificado pela primeira vez em 3200 a. C., a capital era Memphis, que fica perto onde hoje é o Cairo. Naquela época, Wadjet e Nehkbet tornaram-se co-protetores e patronos do reino, e eram comumente chamado de as "Duas Damas". Nenhuma tentativa foi feita para substituir Wadjet por Nehkbet, embora Sekhmet substituísse Bast como a Deusa oficial da guerra do Egipto. Bast foi reduzida de um leão para um gato comum, e o seu nome foi mudado para Bastet, que é o diminutivo de Bast.

Dentro do Egipto, algumas das grandes cidades tinham os seus próprios panteões, que mais tarde seriam fundidos na cosmologia geral. Por exemplo, já em 2700 a. C., os habitantes de Hermópolis eram conhecidos por adorar uma Deusa-Mãe chamada Hator, que era frequentemente descrita como uma vaca, seu conjugue era uma divindade chamada Ra, que era um deus-sol. 

 

Imagem 63 - Representação de Hator, a Deusa com cabeça de vaca, 18ª Dinastia (1417-1379 a. C.) peça esculpida em diorito porfirítico. Museu Metropolitano de Arte, Nova Iorque.

 

Hator era relacionada como sendo uma deusa da fertilidade ainda mais antiga que a conhecida Bat, que também era retratada como uma vaca. Ambos, Bat e Hator, estavam associadas à música alegre e à dança, muitas vezes o seu clero tocava um instrumento chamado Sistrum, que pode ser visto em inúmeras esculturas e obras de arte. Hator era na verdade a divindade mais popular do seu tempo, e era assistida por Sacerdotes e Sacerdotisas.

 

Imagem 64 - Cabeça de Hator, resto da alça de um sistrum. Cerâmica, 18ª dinastia, Tebas. Museu Petrie de Arqueologia Egípcia, Londres.


Video 1 - Como se toca um sistrum?


Na cidade de Tebas, era adorada outro arquétipo da Deusa-Mãe chamada Mut. Quando Tebas tornou-se na capital, em torno de 2200 a. C., Mut começou a substituir Wadjet e Nehkbet e, junto com o seu consorte Amon, acabou por dominar o panteão nacional.

Mut era contudo uma divindade muito antiga, que começou como a personificação do cosmos e evoluiu para criadora e mãe. Ela foi talvez a primeira Deusa a ser retratada como humana em vez de animal. A Rainha era a sua Alta-Sacerdotisa, e os seus templos eram administrados exclusivamente por mulheres.

Devido à sua localização, o Egipto não sofreu uma invasão directa dos Kurgans, até algures entre 1800-1600 a. C., quando a parte norte do país foi tomada pelo que eles chamavam de Hicsos, ou "governantes estrangeiros". Alguns historiadores acreditam que isso ocorreu como um súbito assalto militar, enquanto outros consideram que foi mais uma incursão gradual.

Os líderes hicsos eram aparentemente Cananeus, embora as suas tropas tivessem sido tomadas de várias áreas do Oriente Médio. Eles governaram o Delta do Nilo por vários séculos e introduziram coisas como o cavalo, a carruagem e o arco recurvo composto. Uma vez que estes dispositivos militares avançados tornaram-se disponíveis para os Egípcios do sul, eles usaram-nos para atacar e expulsar os Hicsos, por volta de 1550 a. C.

Como era de se esperar, os Hicsos inicialmente seguiam um deus-guerreiro Cananeu, tal como Baal, mas logo adoptaram a divindade egípcia Set como a sua mascote. Este era considerado o deus das trevas e do caos, e os Hicsos reforçavam grandemente essa reputação, até que este passou a ser considerado uma força aterrorizante do mal. Embora o período Hicso tenha sido breve, teve consequências profundas... incluindo um foco significativamente maior na guerra, exércitos permanentes e divindades masculinas.

Houve outro evento interessante por volta de 1340 a. C., quando o Faraó Akhenaton tentou forçar o Egipto a converter-se ao culto monoteísta do deus-sol Aton... mas a tentativa fracassou e, pouco depois da sua morte, o Egipto retornou às suas divindades tradicionais.

Por volta de 1250 a. C., o Faraó Ramsés II transferiu a capital de Tebas para o delta do Nilo. Tebas entrou então num período de declínio, e como o panteão de Hermópolis era mais popular na parte norte do país, começou a tornar-se dominante. Por volta de 1100 a. C., Mut foi substituída por Hator (agora representada como mulher)... e mais tarde, Amon fundiu-se com Ra, ficando Amon-Ra.

Algum tempo depois desse rearranjo das divindades, a deusa Ísis começou a destacar-se. Ísis era um arquétipo menor da Deusa-Mãe do norte do Egipto, datado pelo menos de 2500 a. C. Ela era inicialmente considerada como sendo a filha de Hator e Amon-Ra, mas com o passar do tempo, ela começou a assumir as qualidades de Hator e a substituiu-la. Ao mesmo tempo, Osíris substituiu Anúbis como deus do submundo, e Hórus substituiu Amon-Ra como o deus do céu. Essas três divindades... Ísis, Osíris e Hórus... viriam a tornar-se nas entidades centrais do último panteão Egípcio.

Ísis tornou-se conhecida como a deusa da fertilidade, filhos, natureza, magia e a principal divindade da criação. Ela foi retratada como uma mulher bonita, e em vários momentos com criança, com os chifres e disco solar de Hator, e o sistrum ou a cruz de Ankh. Ela era assistida por Sacerdotes e Sacerdotisas, incluindo alguns que eram transexuais. 

 

Imagem 65 – Ísis segurando um sistrum. Estátua em mármore da época Romana, c. 150 d. C.


Com a entrada de Alexandre no Egipto em 332 a. C., a adoração a Ísis espalhou-se por todo o império Grego. Quando o Egipto esteve na posse Roma, 30 a. C., a expansão continuou com a adoração a Ísis a alcançar lugares como a Alemanha, França e Inglaterra logo depois. Os Romanos igualaram Ísis a Cibele... e sem dúvida, haviam muitas semelhanças.

Infelizmente, a história da Deusa-Mãe no Egipto terminou da mesma maneira que nas outras religiões pré-Cristãs, em todo o Império Romano... os templos foram queimados e os Sacerdotes e Sacerdotisas assassinados pelos Cristãos, a partir do século IV d. C.


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